quarta-feira, 31 de julho de 2013

sobre brincos e laços

  desde que a Mallu nasceu algumas pessoas começaram a pressionar pra que ela tivesse as orelhas furadas. o primeiro a se opor duramente contra isso foi o pai dela, dizendo que não queria que a filha passasse por uma dor desnecessária.
  nós dois decidimos que esse "furo nas orelhas" não ia acontecer partindo de uma questão óbvia: as orelhas não são nossas. as orelhas são da Mallu, que é nossa filha, não nossa propriedade. quem somos nós pra furar qualquer parte daquele corpo que não é nosso? corpo dela, regras dela.
  dizem que ela vai querer de qualquer jeito quando crescer. será? como podemos ter essa certeza? e se ela quiser, ela vai usar. terei o maior prazer em acompanhá-la pra escolher os brincos e furar as orelhas (ou sei lá onde já terão inventado de colocar piercings até lá), e então ela vai perceber que tem autonomia sobre o próprio corpo.
  dizem também que bebês não sentem dor ao furar as orelhas. nem preciso comentar, né? bebês são, veja só você, GENTE. e gente sente dor sim, senhor.
  além do que seria muito contraditório que eu, que lutei por um nascimento sem intervenções desnecessárias pra minha filha, fizesse esse tipo de intervenção sem motivo algum, por uma vaidade que nem é dela.
  já ouvi piadinhas a respeito das roupas que a Mallu usa. acham estranho que ela não ande por aí enfeitada como uma boneca, cheia de laços no cabelo, vestidos, sapatinhos. e é muito simples o motivo de ser assim: ela NÃO é uma boneca. ela é - vou falar mais uma vez - uma pessoa. uma pessoa que precisa do máximo de conforto possível. imagine-se dormindo de vestido rodado, laço no cabelo e sapatos nos pés. não dá. pra ela também não.
  assim que comecei a fazer o enxoval da minha filha procurei por peças que fossem neutras. e foi muito, muito difícil encontrar. tanto que o enxoval dela é em sua maior parte cor-de-rosa ou lilás, principalmente as peças que foram ganhadas. as lojas de bebê praticamente tem um setor "masculino" e outro "feminino", e sempre que as vendedoras perguntavam o sexo da minha filha e eu respondia ser uma menina, vinham com aquela frase clássica "ah, que lindo! menina é muito melhor de enfeitar". enfeitar um bebê com que finalidade, meudeusdocéu? às vezes a Mallu usa faixinhas no cabelo, chapéu, mas é super raro, e só quando ela não se mostra incomodada. não vejo motivos pra minha filha sair com brincos, sapatos, vestidos e laços. ela não é uma mini-mulher e muito menos tem que atender aos estereótipos de gênero da nossa cultura. 
  quando ela tiver idade pra isso vai poder escolher se vestir como quiser. antes disso nada de esmaltes "infantis" nas unhas, nada de sandálias com salto-alto (sim, existe essa aberração pra crianças), nada de roupas que não permitem que ela se movimente e descanse com o máximo de conforto possível. jamais vou impor um modelo de feminilidade machista pra minha filha e muito menos sexualizá-la precocemente. 

  vai me dizer que essa coisa-mais-linda-do-mundo precisa de algum enfeite ou orelha furada?


sábado, 27 de julho de 2013

recomeçar


  O blog ficou desatualizado. É que entrar aqui me lembra uma época que ao mesmo tempo em que foi maravilhosa, me faz arrepender de muita coisa.
  Me preocupei demais com enxoval, decoração do quarto, essas coisas todas que no fim não fizeram quase diferença nenhuma. E deixei pra trás o que realmente importava: o empoderamento pro parto e pra maternagem. Não é que ele não tenha acontecido, que eu não tenha caminhado a passos curtos até chegar onde precisava. Eu cheguei - do meu modo, da forma como podia. Pari minha filha mesmo indo contra um sistema obstétrico cesarista e machista. Mas não foi como eu queria, simplesmente porque eu não consegui lutar mais um pouco. Hoje percebo que eu precisava ter vencido algumas amarras que trago desde a infância, e por isso eram tão fortes e tão difíceis de superar.
  Lembro que depois do parto tive um pouco de medo. Comecei a pisar num terreno que, por mais que imaginasse como seria, não sentia segurança. Não havia pensado a fundo como seria amamentar, passar o tempo todo com um recém-nascido grudado em mim, ter privação de sono por longas semanas, não conseguir comer tranquilamente, ou ir ao banheiro quando quisesse. Não havia me preparado pra todos os palpites que viriam, pra seguir minha intuição (eu nem acreditava muito nela, pra falar a verdade), pra saber que tipo de cuidados e criação eu queria dar pra minha filha. Não fazia a mínima idéia da explosão de sentimentos que o pós-parto traz, do amor materializado que seria o meu bebê, do peso e da delícia de ser mãe. Só sabia que amava muito a minha filha e que em cada decisão que tomasse esse seria o mais importante: o amor, o carinho, o respeito.
  E foi com a prática - e muita leitura também - que aprendi a ser mãe. A ser alimento físico e emocional. A ultrapassar barreiras há muito erguidas em minha vida. A pensar, repensar e trespensar no que melhor se encaixa minha maternagem.
  Muitas das pessoas que me conhecem acham que sou uma mãe fresca, chata, radical, xiita, maluca. E eu só acho que sou uma mãe apaixonada. Uma pessoa que se encontrou na maternagem, que se descobriu muito mais forte e poderosa. Que exala amor e coragem por todos os poros.

  O blog continuará tendo como foco a Mallu, o nosso dia-a-dia, o nosso crescimento. Mas agora com menos firula e mais realidade ;)


 
 

terça-feira, 9 de julho de 2013

seis meses de amamentação exclusiva em livre demanda



há seis meses, antes de te parir, tive que parir muitas dores e muitos medos. eu precisava estar nova, limpa, nua de corpo e alma pra te receber como você merecia. e assim foi. trabalhamos juntas um dia inteiro - com a presença amável e maravilhosa do papai. descobri uma força que nunca imaginei que teria: em algumas horas eu fui capaz de me transformar e me redescobrir completamente. e então você chegou, com seu cheiro doce e quente. eu te recebi dizendo: "oi, meu amor. oi, minha linda. nós conseguimos!".
a partir daí precisávamos nos reconectar, assim como estávamos por aquele cordão umbilical longo, que o papai cortou quando parou de pulsar. logo que pude te dei o peito. nós duas estávamos ainda desajeitadas, não sabíamos muito bem o que fazer.
durante algum tempo doeu. machucou, sangrou, fez ferida. doeu muito mais ouvir tantas vezes (e de pessoas tão queridas) que não era suficiente, que meu leite era fraco (como poderia se eu me descobri inteira e forte?), que não te sustentava, que você mamava o tempo todo porque sentia fome. não entendiam que um vínculo inexplicável se tornava mais forte a cada vez que você sugava, que nós nos olhávamos, nos acarinhávamos, nos amávamos ali, sendo uma da outra.
persistimos. acabou a dor, só ficou a confiança e a crença num poder que vem desde o princípio da humanidade: assim como fui capaz de te gestar e te parir, seria sim capaz de ser seu sustento, seu alimento da carne e da alma.
hoje completamos seis meses de amamentação exclusiva em livre demanda. seis meses trabalhando juntas mais uma vez. seis meses de um amor que, assim como você, foi gestado, parido e alimentado, dia após dia.
e o que eu tenho a te dizer é o mesmo que te disse enquanto te recebia pela primeira vez em meus braços: nós conseguimos, meu amor! juntas nós conseguimos.  ♥


amanhã começa uma nova fase nas nossas vidas. hoje não - hoje eu quero aproveitar o último dia sendo tudo o que você precisa.